Manter o silêncio na classe
Este foi um dos problemas mais comuns mencionados pelos professores estagiários em particular, e o conselho mais habitual dado pelos orientadores foi não gritar para que parem, mas esperar que os alunos fiquem em silêncio e prestem atenção antes de começar a falar, como um maestro prestes a começar uma peça musical com a sua orquestra.
Cowley (2002: 22) eloquentemente comprova esta abordagem:
‘A minha primeira conversa com uma nova classe é sempre acerca do meu requisito de silêncio quando eu falo com eles. Deixo bem claro que vou alcançar este requisito não importa por que meios… Quando trabalhamos com crianças desafiadoras, ou numa escola onde o comportamento é um problema sério, tal torna-se mais difícil. A tentação é desistir ao primeiro obstáculo, de gritar sobre as vozes deles no desespero de conseguir completar algum trabalho, mas considere os sinais que está a dar se fala com eles quando eles não estão a escutar. A mensagem é que… não vai esperar que eles o escutem a si.’
Cowley continua e sugere uma gama de estratégias no seguimento deste objectivo, incluindo esperar que eles fiquem quietos: ‘Se tiver coragem chame a atenção dos alunos’ e numa espécie de bluff espere que eles fiquem em silêncio. Se tiver determinação em esperar, eventualmente muitas das classes irão ficar mais calmas sem qualquer contribuição da sua parte.’
Este é talvez um bom exemplo do princípio de procedimento, que deve ser tentado para ver se funciona ou não. Uma das perguntas padrão colocadas nas entrevistas com os professores foi ‘como é que eles tentam acalmar a classe de modo a começar a lição’. Muitos deles mencionaram a estratégia de não começar a lição até que todos estivessem em silêncio. Em dois casos, os professores comentaram que não funcionou (depois de esperarem de entre 23 a 40 minutos). Em vários outros casos, os professores questionaram se o tempo e esforço despendidos nessa espera justificavam em termos de tempo de ensino perdido:
‘Com os grupos mais difíceis nos períodos da tarde continuo a dar a aula mesmo quando alguns alunos falam. Continuo a não ter o poder de conseguir com que todos estejam em silêncio durante um período de tempo e isso faria com que a lição começasse e parasse várias vezes, iria perder demasiado tempo.’
(Professora recém licenciada)
Um orientador sugeriu que por vezes os professores estagiários, por razões que podemos entender, não possuem a confiança e perseverança nesta estratégia durante tempo suficiente para que esta funcione:
‘Vejo alguns professores estagiários desistir antes do tempo… começam a ensinar quando a classe ainda não está em silêncio ou a prestar atenção… estão lá quase… e se eles dissessem “Ainda não estão todos em silêncio… Gary? Alan…?” mais um minuto e eles teriam parado, mas o professor não teve essa confiança.’
(Terceiro ano de ensino)
Vários professores mencionaram que ficar persistentemente sem falar até que os alunos se calem não funcionou com eles, embora em vários casos tal tenha demorado um tempo considerável:
‘Mais do que qualquer outra coisa requereu teimosia e perseverança. Até ao Natal, estava sempre a chamá-los à atenção de que não devem falar quando eu estou a falar. Temos um sistema de 5 passos… depois do nome deles estar no quadro 5 vezes por uma transgressão eles têm que sair da sala de aula. Tive que constantemente usar este sistema, e escrever os nomes deles no quadro quando falavam fora da vez deles. Não parecia estar a funcionar e depois do Natal começou a produzir efeito… começou a funcionar.’
(Professora recém licenciada numa escola difícil)
‘Tive uma classe do ano 8 que simplesmente era impossível mantê-los quietos. Em certas ocasiões a vice-presidente da escola tinha que vir à classe para que eles se calassem. Depois de um trimestre a impor a mesma regra, lição após lição começou a funcionar. Mesmo os alunos que regressavam da sala de castigo obedeciam… eles fazem o que os outros miúdos aprenderam a fazer. Não quero dizer que agora estão em silêncio o tempo todo, ou que as coisas são fáceis agora mas comparado com o primeiro trimestre é uma transformação.’
(Professor recém licenciado)
‘Com uma nova classe faço um esforço consciente na primeira aula, na primeira semana, de passar bastante tempo e dedicação com eles de maneira bastante razoável mas firme e a transferir efectivamente algumas das regras básicas…. Apenas duas ou três, e a principal é não falarem ao mesmo tempo que eu falo. Eu deixo bem claro que não é aceitável se eles falarem ao mesmo tempo que eu, e que se tal ocorrer irei aplicar uma pequena sanção razoável. Assim que um aluno desobedece a essa regra eu chamo-o à atenção. Se o professor consegue ter esta regra como aceite e obedecida para que todos saibam o que acontece desde a primeira semana… essa será a norma que o aluno não fala ao mesmo tempo que eu. Torna tudo mais fácil e na nossa escola conseguimos que os alunos obedeçam na maioria das aulas se nos comprometermos a isso. Não vai funcionar se o professor tiver muitas regras… se existem 10 regras para eles se lembrarem e obedecerem… estamos sempre a repetir o memo. ‘Tira o teu casaco’, ‘pára de te virar para trás’, ‘não batas na mesa’, se o professor está constantemente a chamar a atenção deles para algo, de modo implacável e negativo… não vai funcionar. Primeiro, as coisas mais importantes. Se conseguir que eles se calem quando você estiver a falar isso já é um feito importante.’
(Quarto ano de ensino)
‘É uma série de pequenos passos… Eu espero que eles se calem. Se alguns deles continuarem a falar eu levanto uma sobrancelha e faço contacto ocular para lhes dar o sinal. A esta altura alguns deles resignam-se ao facto e param de falar. Eu agradeço os que têm estado calados, “Obrigado 7R pela ajuda. Chamo pelo nome àquele que ainda está a falar para parar de o fazer. Caso não o façam eu anuncio que eles terão que ficar no final da aula para falar comigo. Eles sabem que eu irei fazer algo no final da aula que será de algum modo um inconveniente para eles. Dou-lhes várias oportunidades de obedecer. Demora uns minutos e um pouco de paciência mas na minha escola, na maioria das aulas e com a maioria dos alunos funciona, em parte porque eles estão habituados a este ritual, a este método de fazer as coisas. Estou ciente que pode não funcionar em todas as escolas, ou se não conhecer bem os alunos. Demora um pouco de tempo para estabelecer rotinas e rituais.’
(Professora recém licenciada)
‘Existem algumas pessoas com a sorte de terem uma presença tão natural e carismática que com apenas um olhar conseguem impor o silêncio. Não sendo uma dessas pessoas, a única coisa que eu encontrei que funciona é pura persistência – parar a cada vez que me interrompem e desde o início do ano fazer de um par de alunos o exemplo para os outros – telefonar aos pais, colocá-los de castigo, etc.’
(Segundo ano de ensino)
‘Fica mais difícil com os alunos do ano 9, eles ainda não interiorizaram esta informação, por isso não posso apenas olhar para eles ou avisá-los… Tenho que parar, elogiar e agradecer aos que se estão a portar bem, relembrá-los das regras… mostrar-lhes o cartão amarelo de aviso – e se tal não funcionar tenho que agir de um modo mais específico que os desencoraje.’
(Segundo ano de ensino)
‘Fazemos um progresso gradual em ritmos diferentes com grupos diferentes. É necessário ajustar a reacção ao que ocorre de acordo com o que está a correr bem ou mal. Com alguns grupos tenho suficiente confiança em parar a aula se alguém estiver a falar. Escolher alguns alunos, chamá-los pelo nome… e pedir-lhes de maneira educada e confiante para estarem quietos.
(Professora recém licenciada)
Um outro professor mencionou a importância de não forçar os alunos a estarem quietos quando não era necessário:
‘O silêncio é precioso – não o desperdice’. Se calhar é um lema piroso mas relembrar-me dele melhorou bastante a gestão da minha sala de aula. Alguns professores pedem aos alunos que fiquem em linha fora da sala de aula em silêncio. Eu acho isto má orientação – porque penaliza os bons alunos que chegam cedo, e é uma perda de bom silêncio, porque é que os alunos têm que estar em silêncio se não há nada interessante para os manter quietos? Eu faço um alarido durante a parte da aula em que o silêncio é necessário – digo algo do estilo ‘Agora é a parte da lição em que vocês têm que estar calados durante 5 minutes enquanto eu explico o que vamos fazer’. Tal torna-se particularmente importante com os grupos de baixa aptidão e grupos com muitos miúdos que sofrem de TDAH; eles têm metade da oportunidade de conter-se sem falar se souberem durante quanto tempo precisam estar calados. Com grupos mais complexos, peço a um dos alunos que controle o tempo por mim – e que adicione 2 minutos extra quando alguém fala.’
(Terceiro ano de ensino)
Uma última informação de retorno nesta área: um professor assistente, a dar a sua opinião do quão frequente a estratégia de esperar que se calem realmente funcionou:
‘O que me surpreendeu foi a frequência com que funcionou…. Acima dos 90% … por vezes mais rápido que outras… mas nem sempre.’
Que conclusões podemos tirar de tais testemunhos? Que esperar que os alunos se calem nem sempre funciona? Que por vezes não justifica o tempo que se perde? Que por vezes os professores não perseveram durante tempo suficiente? Que tem que ser usado em conjunto com outros métodos para que funcione – por exemplo, escolher os alunos que estão pouco dispostos a estar quietos e castigá-los? Que as hipóteses de sucesso dependem da escola em que o professor ensina?
Vários formadores de professores sugeriram que uma das diferenças entre os formandos que desenvolvem uma técnica de excelência é o método de ensino e aqueles que fazem menos progresso tem a ver com possuírem uma ‘mentalidade aberta’. Ler os trechos acima fez alguma diferença nas suas opiniões acerca de esperar que os alunos se calem? A sua prática vai ser de algum modo diferente agora que leu estes trechos, ou vai continuar a fazer exactamente o mesmo que antes?
Tirado de Haydn, T. (2012) Gerir o Comportamento dos Alunos, London, Routledge: 80-84.